quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Beleza americana



Jodhi Segall


Hipocrisia.
Hipocrisia.
Hipocrisia.
Eu também sou hipócrita!
Um certo desconcertante descontentamento invadiu meu mundinho vazio.
Minha pequenez mundana se descortinou na embriaguez torpe dos errantes solitários.
Um gosto de fracasso, um cheiro de merda e um ranço de porco e cachaça.
Bem diferente da pipoca e da primeira esperança de se bem querer bem.

Ás vezes despertamos felizes, ainda que desnutridos de qualquer caráter.

Fala-se de lealdade.
Procura-se afirmar qualquer verdade.
Gritam pelas ruas: liberdade!

Meus sonhos todos em outros vingaram.
Todas as minhas incompletudes feneceram.
E com elas minha estúpida e tola alma.
O erro é companheiro dos ventos.
Não nos imobilizam, os erros.
Nos jogam contra nossa infindável ignorância.
Nos acrescentam.
A prudência é sagaz.
Previdente.
Organizada.
Institucionalizada.
Econômica como um bom casamento entre dois estúpidos.
A coragem é um risco.
Quem não se expõe não se arrisca.
Quem não vive não se precipita.
Quem não ama nada possui. Nem vida.

Ás vezes dormimos felizes, ainda que desnutridos de qualquer caráter.
Falamos sobre justiça.
Mas não há justiça dos vencidos.

Falamos de virtudes.
Mas o que é a virtude senão a institucionalização do vício.
Precisamos muito mais do vício do que das virtudes...
Pessoas virtuosas não nos são úteis.
O mendigo é mais útil que o professor.
O traficante é mais necessário que o coletor de lixo.
A prostituta é mais honesta que a nossa concubina, esposa, amante.
Sexo pago é mais barato que fazer promessas que não podemos cumprir.
Nada como a felicidade da liberdade do adultério consentido...

E tudo é sentido. Fazer ou não? Seguir ou não? Ter ou não?
Que se dane!!!

E tudo é contrato:


Porra, mano!! A fora o desespero econômico e financeiro que se tornou generalizado e crônico, a saúde até que está muito condescendente. Estou com problemas para pagar a porra do plano de saúde, mas agora no fim do ano espero controlar as coisas. É a idade das ITES, aquela que precede as das OSES. Otite média crônica, presente! Laringite, presente! Gastrite, presente! Estomatite, presente! Duodenite, presente! Broxite, vez ou outra, dependendo da dosagem alcoólica e do esforço compreensivo da vagaba!! Porra, se eu soubesse que chegar aos 50 ia ser esse desastre, sei não, viu!! É claro que a Idiotite é acumulativa e depois dos 40, dificilmente reversível!!!

Não diferente de ti cumpadi! É por aí...
Não exponha suas misérias...
Não mais do que já expostas, sabidas, reveladas.

Não mais que isto:

O alcoolista manipulável, em álibis transformado.
O viciado em heroína que é presidente do senado da república federativa dos alienados.
Os restolhos pelas ruas e avenidas descartados em latrinas de maconha e crack.
A Aids está aí! E daí?!
Também se morre de gripe, dengue, malária!
Se morre de descuido, desprezo, desamor!
Diz-se até que por amor se mata e se morre.

E nada mata mais do que o amor!!

A morte é a morte! Que se foda!!!
Tanto faz quanto tanto fez.
O desemprego taí!
Amanhã nem teremos mais aposentadoria. Que dirá emprego...
E tudo é contrato.
O policial é o natimorto da sociedade.
O delegado, uma libélula deslumbrante na boca do sapo.
O juiz, um contra-senso jurídico.
O réu é o único que não sendo inocente, se torna mártir de uma revolução às avessas.
As avenidas, ruas, vielas, becos e praças definem nossa profunda conformidade.
É tão fácil instalar câmeras, grades, muros altos, cercas eletrificadas...

O holocausto está aí!! Evoluímos... Globalizamos nossas selvagerias.
O campo de concentração agora é na sala, na copa, na cozinha, no quarto de cada casa.
A pedofilia é a glória do momento.
O estupro é a maravilha do orgasmo social.
As mulheres espancadas e mortas são o supra-sumo da restituição do direito universal masculino de foder quando, como e com quem quiser.

É que nem política:

E cale a boca: vadia!! Vagabunda!!
Chupa, cacete!! Chupa!!
Chupa gostoso, porra!!
Abra as pernas, filha da puta!!
Me dá logo esse cú, caralho!!

E dá-lhe porrada!! Mas tudo com muito, muito, muito amor!

O Brasil não é uma prostituta... A foi por muito tempo.
Agora é como uma primeira dama entre as nações: a grande cortesã!
Nada, nada como a felicidade da liberdade do adultério consentido...
Literalmente: tudo é contrato!

Nada, nada como morrer feliz, ainda que desnutridos de qualquer caráter.

Brasília desperta.
Esperta essa cidade dormitório...
Cidade dos méritos.
Pátria da meritocracia.
Cidade das asas, dos grandes laços.
E tão pouco espaço para quem caminha...
Nenhum lugar para o homem comum.

Diz-se capital.
Talvez por isso tão distante do povo ao qual governa.
Talvez por isso inexistente aos olhos, aos gritos ou ao pulsar daqueles a quem representa.
Corrupta essa cidadela.
Cidade cadela.
Cidade puta.
Cidade dependente química, dependente econômica, dependente, dependente...
Talvez por isto a nação seja tão mediocre, tão dependente da opinião externa.

Nem por isso Brasília deixa de ser bela em alguns momentos.
Vi um corpo boiando no lago Paranoá, não era de deputado, nem senador.
Não era o meu, por ora...
Então não era ninguém, e o sol brilhou e se pôs maravilhosamente sobre a paz dos covardes.
A lua veio. E algumas recordações amorosas me invadiram...
O amor por lá é invasão e reintegração de posse. Ou isso ou nada.
Quem mais ama, mais trai.
É uma cidade anfitriã!

Rosa está lá já faz tempo.
E eu logo estarei por lá.
Emburguesar-se é a evolução natural dos misantropos e misógenos.

O poder é o poder. Só isto.

Contei meus últimos tostões.
Sangrei meus últimos suspiros de amor e saudade.
Esqueci, por fim, minhas desavenças com a riqueza.
Adeus miseráveis!!
Vou-me embora para Bruxelas...

Hummmm! Por um momento entendi o que é liberdade...

Ninguém gosta de fracassos...
Nem Narciso. Quanto mais Apolo!

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