O amanhã que
queremos. Ou não? (Parte I)
José Dias
Nota introdutória: aqui
apresenta-se um cenário, não verdades absolutas. N.A.
Diante
de um mundo que se divide entre os interdependentes e os subservientes, onde
já há muito impera a ilusão coletiva de uma humanidade evoluída e próspera,
tendo por certo a ruptura dos conceitos de classe até hoje elegidos como
fundamentais para o entendimento ideológico-político dos conceitos econômicos,
há de se questionar: quem seremos a partir da metade deste século?
Apesar
de um século nos separar da Revolução Socialista, e termos em Leon Trotsky um
norte acerca da Revolução Permanente, onde as classes trabalhadoras alcançariam
o domínio social, político e econômico mundial através da consciência de si e
de sua relevância na composição do valor econômico das riquezas produzidas, ou
seja, a mais-valia que Karl Marx tanto esmiuçou, mas que em Trotsky toma o
entendimento superlativo de luta de classes e na qual não há como haver
entendimento entre elas, pois a burguesia é dona do poder e o proletariado é a
sua fonte primaz, observa-se que: sendo,
neste contexto, a política estrutural vigente através de partidos, apenas um
instrumento burguês de reformas de um estado medieval de valores e princípios
inumanos, sempre reproduzidos na forma capitalista de ser e chancelados pela religiosidade
imperante, criou-se uma esfera de suposta importância messiânica de cada
indivíduo sobre as reais necessidades coletivas.
Não
obstante ao fato de que todo opositor carrega em si a necessidade de seu
oposto, capitalismo e socialismo justificam-se um ao outro, não havendo, no
entanto, interação quanto ao fator humano. Não há de se questionar as
diferenças existentes entre as diversas formas de capitalismos, nas quais
pode-se inserir as correntes deformadas dos socialismos implementadas no século
passado, e que redundaram no presente enquanto meras ditaduras.
Da
mesma forma, a democracia não respondeu ás diversas demandas sociais seculares,
anteriores ao colonialismo e agravadas no pós-segunda guerra. Mas, por ora,
considerando-se que na realidade há mais “ditaduras-democráticas” do que
socialistas, e que a concentração de renda é um obstáculo ainda maior do que a
concentração de poder político aos princípios expostos na Declaração Universal
dos Direitos Humanos, a democracia é uma possibilidade de governança cujo
entendimento da corresponsabilidade de produção de equidade entre povo e
governo ainda carece de basilares.
A
democracia deveria valer-se exatamente da gestão das diferenças em prol do bem
comum. Ainda que as diferenças de classes sejam notórias mundo á fora, e nos
supostos socialismos possamos averiguar alguns mais vermelhos do que outros,
não por caráter ideológico, mas gradações de suas misérias ocultadas por suas
políticas de Estado, são nas democracias capitalistas onde residem as maiores
contradições, as maiores injustiças, as maiores desigualdades.
Há
quem justifique os ditadores e os considerem homens voltados ao bem pátrio, no
entanto, a história os contradiz; há quem justifique os imperadores, afirmem
sobre sua estabilidade representativa, sobre a capacidade de um império
sobrepujar e conquistar o outro, mas todos fenecem diante da escassez ou
grandiosidade; há quem justifique a democracia, mas ela é também um reflexo de
uma utopia republicana; há quem justifique o socialismo, mas por ora ele é
apenas um moribundo a questionar por quês outrora respondidos.
Incrivelmente,
ninguém justifica o povo, o trabalhador, o operário, o agricultor. Nem mesmo
eles próprios. Tamanha a ilusão criada e reproduzida ao logo de milênios que a
maioria dos pobres não se reconhecem enquanto sua real circunstância; sequer
questionam a reprodução de suas misérias; afinal, por que existem?
O
fato de que pessoas famintas não fazem revoluções já é uma das respostas
passíveis de aceitação. Mas as piores são as iludidas: a suposta classe média,
que pensa que é rica, mas que pobre é, e, portanto, crê que não faz parte dos
pobres e miseráveis do mundo, não se vê como proletariado, mas signatário de um
destino manifesto de riqueza e poder, opulência e valor, logo, não se apercebe
de sua subserviência à verdadeira burguesia.
Essa,
a burguesia verdadeira, cujo poder individual representa-se por uma fortuna
pessoal superior ao PIB de muitos países, não está nem um pouco preocupada.
Quanto mais pessoas acreditarem que há esta esperança meritocrata embasada no
empreendedorismo, seu sucesso financeiro e sua capacidade de engolir mercados
estarão sempre em expansão. Tamanha a desenvoltura das dinastias renascidas e
criadas no pós-segunda guerra mundial, que não satisfeitos com o brutal acúmulo
de riqueza, hoje, devoram Estados-Nações, o que no século XX conquistou-se
através da expansão bélica, no presente se consolida com a total dependência
tecnológica de 2/3 do mundo.
Neste
sentido, eis a contradição: quando verificamos a fome e a miséria no mundo,
onde 2/3 da população mundial sobrevive em condições de carestia, nota-se que
há algo de errado, e está para além da distribuição de riquezas e/ou fim da
desigualdade social. É bem mais que isto.
Na
medida em que verificamos em pleno século XXI um saudosismo nazifascista de ultradireita,
acreditamos também que falimos enquanto sociedade. Quando verificamos sua
instauração enquanto forma de governo em alguns cantos do mundo, temos a
certeza.
É
neste cenário em que chegaremos em Marte antes de chegarmos a algum consenso
sobre quem somos enquanto humanidade e quais as prioridades universais a serem
estabelecidas e alcançadas a médio prazo, uma vez que as Metas do Milênio foram
simplesmente destroçadas a partir da ignorância de nossas realidades.
As
tecnologias da informação de quinta geração, a infomecatrônica, a robótica e a inteligência artificial definem uma
nova era. Há uma nova linguagem a ser aprendida, porém não universalizada. As
relações de trabalho, empregabilidade, assalariamento e renda sofrerão um
impacto gigantesco, justamente – e nada há de coincidência – quando 60 a 65% da
população mundial se encontrará em terceira-idade.
Estima-se
que se na atualidade a população econômica ativa seja representa por estratos
de 30% da população (2,1 bi), e que há um desemprego generalizado que atinge
15% (1,05 bi) da população mundial, representando, em média, 50% do referido
estrato, e que somado ao desalento 20% (1,4 bi), ou seja aqueles que desistiram
da empregabilidade e se sujeitaram ao ”empreendedorismo moderno”, isto é:
subemprego ou algo que beira a escravidão ou a escravidão em si, e que não
entram em estatísticas consolidadas, ou seja, não entram nos cálculos da
População Economicamente Ativa (PEA) enquanto desempregados, chegamos a algo no
entorno 2,5 bilhões de pessoas em situação de risco sócio-econômico e, logo,
dependente de políticas públicas de garantias de direitos. Isto, hoje, outubro
de 2020.
Há
a percepção de que a Pandemia de Covid-19 que nos ocorre neste momento e que
deve perdurar por mais um ano ou até que haja uma imunização eficiente e segura,
o que irá ocorrer de forma desigual mundo a fora e continuará impactando as
economias por mais dois a três anos ou mais, terá reflexos importantes no
cenário futuro, forçando a antecipação da introdução das novas tecnologias
(tecnologias da informação de quinta geração, a infomecatrônica, a robótica e a inteligência artificial) de modo a
reestruturar toda a cadeia de produção e consumo.
Observa-se
que neste cenário - que se estabelecerá em uma década, não haverá espaço para
empregabilidade plena e nem para os “seres improdutivos”, algo já estrutural.
Idosos e deficientes, bem como pessoas de baixa escolaridade terão grandes
dificuldades, maiores que as já existentes, para a própria subsistência.
O amanhã que
queremos. Ou não? (Parte II)
José Dias
Acaso
no presente não sejam tomadas providências em nível mundial para que se
estabeleçam mecanismos de proteção e garantias fundamentais à dignidade humana,
não haverá futuro algum para a humanidade.
O
distanciamento entre as nações produtoras de tecnologias e aquelas que apenas
as absorvem em seus refugos tende a aumentar de forma escalar e continuada. Os
países centrais, embora travem batalhas no âmbito de proteções aos seus
interesses corporativos e de manutenção de suas estruturas produtivas, com o
avanço em proporção geométrica das tecnologias de controle autônomo,
encontrarão dificuldades extremas para a execução orçamentária de políticas
públicas voltadas para o bem-estar social, dada a concentração de capital
financeiro em volatilidade, não havendo uma seguridade capaz de alcançar uma
distribuição de renda e de serviços públicos de forma homogênea.
Com
o aumento desta distância entre as nações, que já é notada e onde os conceitos
de “vocação” e “destino” são aplicados como reprodutores de conflitos políticos
internos e justificativas para as misérias excludentes – materiais e
imateriais, o futuro previsível para o longo prazo é o de um controle absoluto
sobre produção e consumo, podendo-se afirmar que ao fim da década de 2040 a
geopolítica mundial estará completamente redesenhada.
Na
atualidade esse redesenho começa a se firmar, criando-se no controle financeiro
e pecuniário das transações comerciais via sistemas eletrônicos de pagamentos
uma prévia das interfaces que poderão ser adotadas. É possível crer que o papel
moeda não deixe de existir, mas sua circulação será em muito reduzida e onde a
tecnologia não chegue. Outra possiblidade é que se tenha uma moeda mundial,
específica para a computação destes valores virtuais. Ou seja, um padrão para a
sua existência e controle, garantindo os fluxos das transações internacionais.
Mas
este novo mundo, tão maravilhoso para alguns entusiastas, será também um mundo
de sérios confrontos entre o progresso virtual e a realidade concreta. Os
desafios presentes de segurança, saúde, habitação, transportes, educação são
demandas universais e embora encontrem nas novas tecnologias grandes aliadas,
são resultados da empregabilidade, do assalariamento e das rendas das pessoas.
Políticas
tributárias que tragam a equidade fiscal e que permitam uma estabilidade na
produção e manutenção de postos de trabalho, acompanhadas por políticas
salariais que sejam efetivas e garantidoras do bem-estar familiar são uma
urgência global.
Em
tese considera-se que o ganho de U$100,00 (cem dólares) por dia seria o mínimo
para esta garantia, sendo uma per capta de U$25,00 por pessoa/dia a renda
mínima que possibilitaria o mínimo de dignidade humana ao trabalhador.
Quando
avaliada a acessibilidade ao bens e serviços de forma ampla e que atenda a
todas as necessidades familiares estima-se que o assalariamento mínimo ideal
seja na ordem de U$242,00 (duzentos e quarenta e dois dólares) por dia ou
aproximadamente U$30,00/h para uma carga horária de 8h/d. Observa-se que em um
mundo tão desigual, o ganho diário de um trabalhador médio norte-americano é
equivalente ao de um mês inteiro de trabalho para a maioria dos trabalhadores
na América do Sul, por exemplo, havendo outros lugares onde o valor diário não
atinge um dólar per capta sequer.
O
desenho geopolítico futuro é uma abstração tanto quanto a possibilidade de
algum controle absoluto sobre a economia global. A nova colonização cibernética
permite a criação de um mundo paralelo onde a improdutividade é um fator de
alienação econômica. A inconcretude deste ambiente, onde evoluímos da
pós-verdade para a não verdade, é um
campo necessário à sua própria existência.
É
um sistema exclusor onde ao pensar-se incluso, vive-se na ilusão da pertença.
Porém, sob o risco iminente de contrariadas as expectativas individuais – de verdades
e mentiras tão frágeis ao duro e cruel realismo do cotidiano – contraria-se o
coletivo, dotando-se de novas “perspectivas” acerca de um mesmo fato.
No
caso, e exemplos não faltam, ao determinarem uma guerra entre China e EUA
acerca do domínio da tecnologia 5 G, ignora-se que ambos buscam o mesmo
objetivo: o controle e a subserviência das economias periféricas, a
consolidação de suas dependências tecnológicas e, por consequência, o livre
acesso às suas riquezas, sejam elas naturais, materiais, imateriais, enfim. O
que se deseja é a subsistência de si mesma enquanto potência, a baixo custo e
grande lucratividade.
Tudo
não passa de cálculos de custo x benefícios de longo prazo. E, no esclarecer de
suas ambições, partilham entre si dos espólios de suas pilhagens, não havendo
de fato a guerra. Apenas excelentes planejamentos e execuções discretas benfeitas.
Não
há corrupção sem corruptores e corrompidos, e, óbvio, a conivência dos povos
que os admitem. Há alguns povos que os idolatram. Há nações que sem a corrupção
institucional e a dependência desses, simplesmente não sabem o que fazer com
sua liberdade. Afinal, ser livre é ser responsável por si. Por suas escolhas,
seu destino. Não há, portanto, crise de liderança. Há apenas ausência de
caráter.