terça-feira, 14 de março de 2017

As noites frias do cerrado

Jodhi Segall

I
Nossa língua era macro-jê, antes mesmo de mim ou de você.
Mas cintilam seus colibris em veias e veios,
no colorido alegre destes anseios
que ainda brotam dos olhos apaixonados
dos homens e mulheres da minha terra,
jorrando da mina d’água o infinito encantado de cada canto
dos guerreiros mortos na guerra:
Mocurins, Atu-auá-araxás, Puris, Xacriabás, Maxacalis, Crenaques, Aranãs!

Felizes são os olhos que reverenciam a manhã,
pois não há pecado algum quando se desconhece o Santo.
O nosso deus não tinha vergonha de nossa nudez:
não era cristão nem português!

Um deus livre e feliz, jamais escravo nem burguês,
que crucificado foi diante ao ofício da coroa de um padre:
um tal Buá, que de lágrimas ou piedades nada possuía.
Que em nome de São Paulo batizou Minas del Rei
Às terras Geraes dos Campos de Cataguás.

Deflorou as virgens matas desterrando ritos, mitos e lendas.
Diante de tantas riquezas e outras tantas serventias,
reinventou o mundo para além de Tordesilhas,
destinando novas terras aos seus herdeiros, filhos e filhas,
fundando continente o que outrora se chamara ilha.

II
Esta bandeira tremula sobre as alterosas montanhas da Inconfidência
Grita em nome dos poetas: Liberdade antes que tardia
O rubro sangue de seus heróis trespontas no carmim das revoluções primeiras
Nos clarins dos Emboabas à degola de Vila Rica
Terra dos quintos dos infernos e morada de anjos e profetas.
Nasceu ali em Nossa Senhora do Carmo; Minas nasceu dos ribeiros de Sabarabuçu.

Se multiplicou em Mariana, Sabará, Tiradentes, Diamantina e São João Del Rei.
Eis a nossa Conjuração: meu nome é
Minas das Terras Geraes dos Campos de Cataguás!!

III
Anhanguera gerou Gerais
Por entre serras e arroios
Rios e corredeiras
Da serra do mar ao planalto central
Por uma terra sem caminhos
Que não fossem coragens ou covardias
O livre tornou-se escravo
Brotava ali das minas e matas uma nova raça
Um outro povo que não possuía bandeiras
Nem estandartes, brasões ou galardão

O mar é verde como os olhos da cabloca
Como arde o inferno a quem não se encanta com a beleza 



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